domingo, 24 de novembro de 2013

Em defesa do Lulu


Na primeira vez que ouvi do Lulu achei idiota, não ofensivo. Um aplicativo em que mulheres avaliam os homens dando notas e adjetivos sob a forma de hashtag. Pareceu-me bobo, adolescente. Imaginei algo muito mais explícito do que realmente é, que fosse falar de tamanhos de paus, gostos sexuais pouco ortodoxos, broxadas, daí em diante. Não resisti à curiosidade e entrei. E pra minha surpresa, achei divertidíssmo. Não era nada do que eu pensava.

Pra começar, o tal aplicativo que só teoricamente só poderia ser baixado por mulheres pode ser baixado por qualquer um. O site de download não perguntou meu gênero e você entra pelo login do Facebook. Ou seja, qualquer um com uma conta nessa rede pode entrar. Não dá pra levar a sério. Além disso, muito mais recatado do que eu imaginava. As avaliações não se restringem a sexo e podem ser feitas por pessoas com diferentes relações com o rapaz em questão: pela mulher interessada naquele cara, pela namorada/ficante atual, ex-namorada/ex-ficante e amiga. As perguntas e os itens avaliados são selecionados de acordo com a categoria de quem responde.

Os perfis são avaliados por uma série de critérios e quem avalia não é obrigada a responder todos os itens, que incluem perguntas sobre senso de humor, educação, caráter, comportamento, inteligência, e sim, beleza física e sexo, mas nada de tamanhos de pirocas e notas pra práticas sexuais, pra minha total decepção.

Assim que você loga um painel de perfil de amigos do Facebook aparece na sua tela e as fotos dos que possuem avaliações Minha segunda surpresa foi saber que o site mantém muito mais avaliações positivas que negativas. O site gera uma nota média pros avaliados somando todos os critérios e esta nota aparece sobre a foto do perfil. Aliás, dois dos meus amigos que tinham recebido avaliações eram gays, tinham recebido avaliações de amigas, descritos como pessoas gentis e inteligentes.

Mas vamos aos hétero. Mais uma surpresa. Não tinham sido meus amigos mais bonitos e populares que tinham recebido reviews, mas homens fora do padrão de beleza e em geral muito tímidos e reservados e que na maioria das vezes recebiam elogios de pessoas que já tinham ficado com eles, sobre serem educados, cheirosos, inteligentes, atenciosos e sim, beijarem bem e serem bons de cama, o tipo de coisa que em geral as mulheres contam umas pras outras sobre homens com quem já ficaram, estão ficando ou pretendem ficar. Coisas do tipo como responder mensagens rápido, ligar no dia seguinte, dormir de conchinha, se a pessoa fica e some, se sabe cozinhar e sim, o tamanho do pau, porque mulheres hétero em geral adoram falar de tamanho de pau de quem já pegou, tá pegando ou quer pegar.

Sim, passei a tarde olhando os rewiews das pessoas que eu conheço e me diverti muito. Porque é algo muito bobo mesmo. As críticas são mais sobre comportamento do que qualquer outra coisa: ser chato, crianção, muito vaidoso, contar piadas ruins, ter amigos “losers”, demorar pra tomar iniciativa ou notar interesse de uma mulher ou, ao contrário, ser inteligente, divertido, carinhoso, gentil, não ter vergonha de ser fofo, saber beber sem cair, respeitar as mulheres, se é legal com os pais da mulher que está saindo, se é responsável, se saber se virar sozinho seja pra se alimentar ou cuidar do espaço doméstico. Mas mesmo assim eu fiquei contente ver amigos meus recebendo elogios, saber que são considerados legais e/ou gostosos pelas pessoas que já ficaram com eles. E achei engraçado descobrir algumas coisas porque eu gosto de fofoca picante, me julga aí.

Trocando em miúdos, é indiretamente um aplicativo de paquera. Pra saber coisas sobre o cara que você está interessada é legal e tem pegada, talvez até usar isso pra puxar papo. Pra saber se outras mulheres falam bem de pessoas que você tem interesse ou mesmo dos seus amigos. Claro que tem gente que pode usar pra vingancinha. Mas até os comentários ruins estão sujeitos à avaliação, você pode responder se aquilo é verdade ou não, caso um conhecido seu esteja sendo injustamente difamado. Mas a verdade é que as avaliações de ex-ficantes ou ex-namoradas são em geral positivas, principalmente no temido quesito sexo.

Entretando o que me chamou a atenção sobre o Lulu foi a ~polêmica~ envolvendo o aplicativo, que seria uma ferramenta para objetificar os homens, que as mulheres estariam fazendo a mesma coisa que os homens fazem, que se houvesse um aplicativo semelhante para avaliar as mulheres “as feministas” estariam revoltadas e organizando protestos.

Pra começar, já existe um aplicativo que avalia as mulheres e as classifica as mulheres, chama-se vida. As mulheres são objetificadas o tempo todo. Nós nos acostumamos com concursos de misses, com musas da torcida, furacões da CPI, dançarinas de palco, com as mulheres seminuas na publicidade, com atletas de uniforme sexy, com a banalização de intervenções cirúrgicas para fins estéticos, com a ideia de que precisa sofrer para ficar bonita, com a ideia de que mulher precisa ser bonita ou no mínimo se esforçar pra ser bonita, com a imposição de padrões de beleza extremamente excludente.

Mas não é só isso. Nós vivemos numa sociedade que monitora nossa conduta sexual, que cobra que nos casemos e tenhamos filhos e que ensina às próprias mulheres a se verem como prêmios, a se objetificar, a objetificar as outras mulheres chamando-as de vagabundas, periguetes, vagabundas, rodadas, um mundo que separa mulher “pra casar”, que acusa mulheres se serem interesseiras, que julga o caráter e/ou a competência das mulheres dependesse do número de homens que quem ela se relacionou ou se relaciona.

As feministas estariam indignadas se houvesse um aplicativo pra avaliar mulheres? Ah, gente, por favor, né? Alguém aí lembra como foi que o Facebook foi inventado por um cara que tinha se vingado da namorada a expondo num blog? Que o Facebook no começo era pra homens avaliarem a aparência de mulheres? Alguém aí esqueceu que nas últimas semanas três jovens mulheres, duas menores de idade, se suicidaram porque homens em que elas confiaram compartilharam vídeos íntimos delas? Já esqueceram da Fran, que largou emprego, faculdade e que não consegue sair na rua porque a vida dela virou um inferno? Vocês esquecem todos esses sites de pornô amador?

É ofensivo e é uma estupidez comparar um aplicativo com a opressão que todas as mulheres sofrem todos os dias, dizer que estamos agindo igual aos homens. Primeiro porque não estamos julgando o caráter deles baseados no número de parceiras sexuais, não o ridicularizamos por fazer na cama coisas que nós gostamos que eles façam ou por coisas que nós gostamos de fazer. Sim, há mulheres que dão importância à coisas que eu pessoalmente considero uma bobagem, como o cara pagar a conta ou ter um carrão, mas eu não culpo essas mulheres por pensarem desse jeito, porque nós somos julgadas de acordo com o tipo de cara que conseguimos arrumar e somos ensinada que se um cara quer te conquistar ele tem que pagar a conta.

Leva tempo pra se libertar disso. Mas se o Lulu fosse um aplicativo de transformar homens em objetos, não estaríamos preocupadas em saber se o cara é engraçado, inteligente e respeita as mulheres. O grande problema do Lulu é expor algo que é insuportável para mentalidades machistas que é o fato de que mulheres gostam de sexo e falam sobre isso. E que quando estão interessadas em alguém elas querem saber se o cara tem uma boa fama porque elas pretendem fazer sexo com eles. Nós nos acostumamos a ver o sexo como uma coisa que as mulheres fazem pra agradar os homens. É por isso que choca. Porque mulher não pode falar de sexo em público, porque mulher que gosta de dar não presta, mulher que não presta não casa e deus o livre uma mulher não casar, porque todo o sentido da existência da vida de uma mulher é arrumar um marido.

Ironicamente, essa alegada objetificação é opcional, já que só podem ser avaliados perfis do Facebook e qualquer pessoa que não quiser ser avaliado pode retirar perfil do aplicativo. Não há nada parecido com isso na Internet ou na vida para que as mulheres não sejam objetificadas ou vítimas de porn-revenge.Ofensivo é mulher não poder falar de sexo, ofensivo é uma mulher chamar a outra de periguete, ofensivo é aceitar tranquilamente a objetificação das mulheres e sair em defesa dos homens e contra as mulheres numa assunto que é uma bobagem e que não chega nem perto do tipo de julgamento que todas as mulheres são obrigadas a enfrentar ao longo de suas vidas.

17 comentários:

  1. O aplicativo parece light porque está começando. Lembra como o orkut era descolado no começo? Mas será que não periga virar uma central de julgamento dos homens? Só lembrando que os homens também são avaliados e classificados - não pelos exatos mesmos padrões que as mulheres, obviamente - no aplicativo chamado vida! Tem um aplicativo chamado Escola que começa isso desde cedo. Tem outro chamado Rua, outro chamado Futebol, outro chamado Porrada, outro chamado Emprego etc... Acho que a quantificação, o dar notas, o elencar conforme uma escala numérica absoluta, é sempre algo que remete à forma mercadoria. Sim, as mulheres são mais oprimidas e coisificadas. Mas potencialmente toda a humanidade é coisificada pela quantificação. Ou, para falar em termos foucaultianos: por mecanismos disciplinares.

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    1. Opa, agora que me explicaram eu entendi uma coisa que não tinha entendido: não é preciso excluir o perfil do facebook para sair do Lulu, basta entrar e excluir só o do Lulu. Isso explica porque as avaliações são - e tem de ser - tão leves e positivas e ninguém pode acrescentar tags mais incisivas (que acusem o cara de machista, violento, por exemplo), senão o aplicativo se esvazia rapidinho. Bom, é uma brincadeira inocente, mas perigosa, como tantas brincadeiras são...

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  2. Texto interessante, porém que peca em diversos pontos lógicos. Segue abaixo minha contra-argumentação:

    https://www.facebook.com/rcf85/posts/658243450887293

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    1. Eu respondi sua resposta inbox, olha lá depois. :)
      Queria ter respondido nos seus comentários, mas estão bloqueados...
      E o limite de caracteres daqui é muito pequeno...

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  3. eu esperava um aplicativo que fizesse os homens tremerem de medo. Acho importante a mulher começar a atacar aos homens. Gozar da cara deles e do tempo CURTO para chegar ao orgasmo. Do pinto pequeno e fino. Enfim, falar de TODOS os defeitos deles. CURTO mesmo.

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    1. Hmm como ele é diferenciado e descolado. Rebelde pra caramba você hein, nossa senhora! CURTO mesmo. Afetada.

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    2. kkkkkkkkk!! Afetada e mal comida!!

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  4. punk canibal: relaxa que vc ta bem avaliado e alias, o cara com mais avaliações que vi em tão pouco tempo, mas 6 ja!! foram mais de uma centena de visualizações no perfil.

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Logo logo surgirá um aplicativo para os homens avaliarem as mulheres... aí quero ver se vocês vão gostar. Já imagino as opções: puta, safada, vadia...

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    1. "Pra começar, já existe um aplicativo que avalia as mulheres e as classifica, chama-se VIDA. As mulheres são objetificadas o tempo todo."
      Poupa as mulheres e lê o texto......
      O seu pesadelo é real pra gente. Babaca.

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  7. Eu acho bem importante ler esse texto aqui:
    http://www.catarticos.com.br/doce/lulu-seu-recalque-bate-meu-celular-e-vira-app/

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  8. Essa blogueira acha que é culta... Ninguém quer saber a sua opinião não... Carente.

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    1. Eu quero. Minhas Irmãs tbm querem. Vou espalhar pela páginas do Face.
      Ah, carente é vc que precisa agredir uma blogueira tão culta! 2bjos.

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