domingo, 16 de setembro de 2012

Vicky Cristina Barcelona e as (im)possibilidades do amor




Vicky não tinha vocação para o sofrimento e não tinha a menor disposição para a guerra. Em uma relação o que apreciava era a estabilidade e o compromisso. Cristina aceitava sofrimento como parte do amor. Ela não tinha muita ideia do que esperava do amor, mas sabia ao menos o que não queria. E Maria Elena acreditava que um amor só poderia ser romântico se fosse incompleto.

Eu poderia citar mil razões pelas quais esse é um dos meus filmes favoritos do Woody Allen, mas vou ficar em uma só. Vicky Cristina Barcelona é um filme de amor. De como mulheres de diferentes idades, personalidades e formações lidam com o amor, o desejo e as surpresas que a vida coloca em nosso caminho.

Vicky lida com a renúncia de uma paixão arrebatadora em nome da estabilidade do casamento e é confrontada pela mulher mais velha que gostaria de ter vivido uma grande paixão, apesar de amar imensamente seu marido. Ela o ama, mas não é apaixonada por ele há anos. É isso que é ser casada em boa medida. É lidar com algo que os filmes românticos não contam: que casamento é muito mais sobre companheirismo, afinidade, família e um projeto de vida de vida em comum que paixão. Independente disso, a atração por outras pessoas e as paixões continuam. O amor monogâmico não existe, é uma ficção que torna a vida mais fácil. É a exceção, não a regra. Mas amar em liberdade supõe um aprendizado contínuo e conflito. É mais fácil se resignar na ficção.

Então temos Cristina, que se vê como uma livre-pensadora, uma mulher passional, intensa. Cristina não tem medo de se jogar nos braços do desconhecido. Não arreda o pé nem quando surge Maria Elena, uma força da natureza. Juan Antonio, Cristina e Maria Elena se tornam amantes e vivem por um curto período de tempo um romance de experimentações de liberdade, até que Cristina se dá conta que não é aquilo que ela procura. A minha teoria é que ela não aguentou tanta liberdade.

Há algum tempo eu tenho a plena convicção de que amor é possível em liberdade.  Mas como ser livre em um mundo que nos ensinou a amar a prisão? Como reagir à indústria cultural que nos doutrinou desde muito cedo e continua a nos educar para achar que amor, ciúme, e propriedade são a mesma coisa? Como ser feliz quando se ama alguém que quer o Estado? Essa é a tarefa mais difícil da vida anarquista: lidar com o Estado que há dentro dos outros, com o Estado que há dentro de si. É isso que Cristina não consegue fazer.
Maria Elena percebe que é mais feliz quando o laço pesado do amor romântico deixa de ser responsabilidade de apenas duas pessoas. Ela sabia que Juan Antonio e ela se amavam, mas que faltava algo. Faltava outra pessoa. Mais do que isso. Faltava liberdade. Porque manter um casamento não é algo fácil, acho que tem que ser muito ingênuo pra acreditar que não. O problema é que na maioria das vezes nos resignamos na infelicidade compartilhada ao invés de reinventar modos de ser feliz.

Sem a liberdade o fim de todos os amores possíveis que aparecem na tela são pessimistas. Juan Antonio e Maria Elena não conseguem viver juntos. Vicky e sua amiga mais velha se resignam na ideia de que um casamento exige a renúncia da paixão. E Cristina seja buscando algo que ela nem sabe o que é, que ela nem sabe se existe.

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